Não é de agora que, de forma a preencher as lacunas deixadas pelo Estado na disponibilização de serviços essenciais, a iniciativa privada, através da criação de associações ou fundações sem finalidade lucrativa, vem se mobilizando para prestar estes atendimentos às pessoas em estado de vulneração social. Ante a natureza pública deste trabalho, vez que voltado as áreas de saúde, educação e assistência social, nada mais justo de que o Estado lhes concedam determinados benefícios fiscais, os quais são concretizados pela nossa Carta Magna através das Imunidades/Isenções Tributárias.
Por serem consideradas como Limitações ao Poder de Tributar, muito tem-se discutido se o diploma legislativo apto a regulamentar essa matéria é a Lei Complementar ou a Lei Ordinária. Recentemente, para entusiasmo de nossos Juristas, Tribunais e Gestores, o STF traçou um caminho para sedimentar essa questão, vez que proferiu uma decisão, no âmbito da ADIN 2028, aduzindo que, em relação as Contribuições Sociais, os aspectos meramente procedimentais podem ser expressos em Lei Ordinária, no entanto, aqueles que se referem as Imunidades Tributárias, devem estar previstos em Lei Complementar.
Guardadas as recentes discussões, que tratam da necessidade de se obter ou não o CEBAS, certo é que muitas entidades que não o possuem estão ingressando com ações ordinárias perante a Justiça Federal para ter reconhecida tal qualificação, ante a sua natureza declaratória e efeito ex tunc e, com isso, usufruir a citada Imunidade ou, se for o caso, ser ressarcida de eventuais valores recolhidos, respeitado, evidentemente, o prazo prescricional.
Como visto acima, possível constatar que o cenário legislativo e jurisdicional que norteiam as atividades das entidades sem fins lucrativos vem lhes trazendo grandes inseguranças jurídicas, fazendo com que, muitas delas, estejam preocupadas com o futuro, sem saber bem ao certo quais serão os resvalos de tamanhas mudanças, gerando um cenário de extremo pessimismo, afinal, como muito bem afirmou Sêneca, “quando se navega sem destino, nenhum vento é favorável”. Além disso, existem diversos outros detalhamentos e celeumas, como aquele expresso na PEC06/2019, que não serão objeto deste artigo dada sua complexidade mas que futuramente poderá ser melhor aprofundado.
Deixando essa parte filosófica de lado, pegando carona nesse breve introito, mas mantendo como pano de fundo a Imunidade/Isenção das Contribuições Sociais, salutar aduzir que o artigo 29 da Lei 12.101/2009 tratou de incluir o PIS e a COFINS no rol dos benefícios fiscais concedidos às entidades que almejem a qualificação como beneficentes – CEBAS.
No entanto, parafraseando novamente o nobre pensador, que há muitos anos atrás já havia dito: “o homem que sofre antes de ser necessário, sofre mais que o necessário”, inspira o fato do Julgamento do RE 574.706 distribuído em 2007 ter sido retirado da pauta do STF até então agendada para o próximo dia 05 de dezembro de 2019 a Suprema Corte iria tratar sobre os efeitos da decisão de que o ICMS não deve integrar a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS, no entanto, o que se continuará aguardando em sede de embargos de declaração opostos pela União, é a decisão sobre qual parcela do ICMS poderá ser suprimida, se é aquela expressa pelo valor efetivamente recolhido ou se é aquela destacada na Nota Fiscal emitida.
Não obstante os esforços da Receita Federal em consolidar o entendimento de que a parcela do ICMS a ser suprimida refere-se ao valor efetivamente recolhido, que se aperfeiçoou através da apresentação de Solução de Consulta Interna COSIT 13/2018 e a publicação da Instrução Normativa SRF 1911/2019 (artigo 27, I), ela vai de encontro ao entendimento do STF, vez que, em decisão monocrática recentemente proferida, o Ministro Gilmar Mendes assim destacou: “naquela oportunidade, o Supremo Tribunal Federal afirmou que o montante de ICMS destacado nas notas fiscais não constitui receita ou faturamento, razão pela qual não podem fazer parte da base de cálculo do PIS e da COFINS” (RE 954.262).
Tendo como embasamento a decisão acima proferida, a expectativa é que, quando for designada nova data para julgamento dos Embargos de Declaração, a decisão siga essa mesma linha de raciocínio e, enfim, coloque uma pá de cal nesse assunto.
Ressalte-se que referido entendimento tem o condão de gerar efeitos positivos às entidades sem fins lucrativos, em especial àquelas que estejam sendo alvo de lançamentos fiscais, vez que, guardada a discussão acerca da imunidade/isenção prevista no mencionado artigo 29 da Lei 12.101/2009 em relação ao PIS e a COFINS, existe a possibilidade de Impugnar/Corrigir a Base de Cálculo e, com isso, diminuir o tributo devido.
Ademais, caso as referidas Contribuições tenham sido pagas, necessário aguardar como se dará a modulação dos efeitos da decisão que será proferida em sede de Embargos de Declaração, tendo, inclusive, posicionamento da Procuradoria Geral da República - PRG favorável a modulação futura, para que, após isso, seja analisada a pertinência em relação ao ingresso de Ações Judiciais para obter a devolução dos valores indevidamente recolhidos ao fisco federal.
Além disso, seguindo a linha das boas notícias, no dia 15 de outubro de 2019, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa 1911/2019, a qual tratou de sedimentar uma entendimento já bem consolidado em nossos Tribunais, em especial para reconhecer que as entidades qualificadas como beneficentes e que atendam aos requisitos expressos no artigo 29 da Lei 12.101/2009, fazem jus a Isenção da Contribuição para o PIS e COFINS. Porém, referida isenção é válida apenas para as receitas decorrentes de atividades próprias, as quais foram definidas como sendo aquelas provenientes de contribuições, doações, anuidades, ora recebidas de associados e mantenedores, sem caráter contraprestacional direto e destinadas ao custeio e ao desenvolvimento de seus objetivos sociais.
Outrossim, tiveram outros dois pontos a serem destacados neste diploma normativo, quais sejam: (i) a determinação de que as alíquotas do PIS e da COFINS incidentes sobre a receita decorrente da venda de equipamentos ou materiais destinados a uso médico, clínico ou laboratorial e hospitalar, quando adquiridos por entidades beneficentes de assistência social, será reduzida a 0 (zero) e (ii) a não incidência do PIS-Importação e da COFINS-Importação sobre as importações realizadas pelas entidades beneficentes de assistência social, em especial nos casos destes produtos serem vendidos em feiras, bazares e eventos, nos casos em que recebidos como doação de representações diplomáticas sediadas no Brasil.
Com base no acima exposto, apesar do cenário encontrar-se parcialmente nebuloso isto nos leva a crer que o setor público deveria ser o maior interessado no fortalecimento do terceiro setor, tendo em vista a qualidade e a quantidade de atendidos em todo o País, por essa razão é mais do que necessária a criação de condições favoráveis e estáveis para as entidades que executam serviços diversos e albergando uma grande camada da população, em prol da diminuição da desigualdade social.
Portanto, seguindo mais uma vez a linha do citado pensador ao afirmar: “dedica-se a esperar o futuro apenas quem não sabe viver o presente”, o que nos resta a fazer, como membros da sociedade civil e operadores do Direito, é continuar executando nosso trabalho com maestria, ainda que, para tanto, seja necessário enfrentar um mar turbulento e cheios de desafios.
Rodrigo Nako